Shamsia Hassani, a primeira grafiteira do Afeganistão

Shamsia_5.png

Durante quinze anos, Shamsia Hassani deu visibilidade a mulheres que se tornaram invisíveis em uma cultura patriarcal monstruosa. Ela é uma refugiada que só teve contato com a própria origem na adolescência, após o fim do regime talibã no Afeganistão, seu país de origem. 

Shamsia Hassani vive em Cabul. Ela quebrou barreiras históricas ao se profissionalizar como artista e professora universitária; barreiras estéticas, ao fazer street art; e barreiras culturais, ao colocar a imagem da mulher na rua, onde sua presença física sempre foi restrita por preceitos religiosos mais ou menos rigorosos, segundo a tendência teocrática do momento.

Os primeiros grafites de Shamsia mostram mulheres de burca flutuando sobre ruínas produzidas durante o longo período em que o controle do território afegão foi disputado por duas potências mundiais e várias tribos. Essas imagens são uma nota de cor e vitalidade na paisagem arruinada das cidades. Elas evocam a forma mais radical do fundamentalismo islâmico, mas têm algo do mito judaico da Lilith, a primeira mulher, expulsa do Paraíso por se recusar a submeter-se a Adão e, por isso, condenada a vagar eternamente como um fantasma. Com suas Liliths, Hassani reintegrou a mulher ao espaço público.

O passo seguinte foi tirar a burca, revelar o rosto, dar corpo à mulher. São rostos sem boca, uma presença muda que comunica por objetos simbólicos, já que o horror da sujeição plena é da ordem do indizível. São essas as imagens mais conhecidas de Shamsia Hassani, artista que ganhou notoriedade por expressar o ponto de vista da mulher diante da violência contínua e dos efeitos do fanatismo mais cego.

Contrariando o dito popular, o raio tornou a cair no mesmo lugar. De um momento para o outro, Cabul foi tomada pelo movimento talibã, que cresce nas tribos da etnia Pashtun no Afeganistão e no Paquistão, onde Malala Yousafsai foi atacada em 2012. As mulheres afegãs perderam instantaneamente os poucos direitos que reconquistaram em 2001 com o fim do regime que agora retorna mais feroz e destrutivo.

O mundo volta as atenções para Shamsia Hassani, que provavelmente está enfrentando imensas dificuldades para deixar seu país, talvez definitivamente. Que ela receba o apoio necessário para seguir lutando por este direito humano básico: a igualdade.